quinta-feira, junho 18, 2015

Em causa

Trouxe-te pela mão. Abri-te a porta e mandei-te entrar.
Ficaste à vontade e sentaste-te depressa. Parecias confortável.

E de repente era como se que aquele lugar fosse teu. Como se nunca de lá tivesses saído. Como se o habitasses desde sempre e para sempre.
Foi fácil.

Puxei-te novamente. Novamente pela mão te trouxe. Desta vez dei-te a chave. Olhaste-a e depressa a guardaste. Agora era tua. E eu já nada podia fazer.

Olhámos para trás. Não gostaste do que viste. Querias esquecer, fingir que nunca existiu. "Impossível", disse eu. "Terá que ser", respondeste tu. E de um gesto só puxaste a toalha que cobria a mesa. Caiu tudo ao chão. Tudo. "Não vês? Não percebes o que fizeste?" - os meus olhos gritavam em silêncio. Da tua boca um: "Apanha-se, tem calma. Volto a meter tudo no sítio".

Mas não vias o mesmo que eu. Apanha-se, sim. Mas no mesmo sítio? Não. E repito: "Impossível".
Como te atreves? Como tens coragem? Não devias nem podias... pões em causa o que foi e o que será. Sabes como foi difícil?

Fui eu quem te trouxe. Pela mão. Abri-te a porta e mandei-te entrar. Ninguém ia cruzar aquela porta, tinha jurado. Menti a mim mesma, eu sei.







segunda-feira, junho 15, 2015

Já morri

Foi há uns anos. Sonhei que morri.

Uma discussão alheia numa rua que conhecia da infância. Acalmei os ânimos, tudo parecia bem. Viro-me e sou apunhalada nas costas. A dor que senti naquele sonho é indescritível. Uma dor tão aguda quanto abrangente. À minha volta o pânico instalava-se mas ouvia alguém calmamente dizer-me: "não te preocupes, o INEM vem aí". No sonho não respondi mas lembro-me que pensei: "Não interessa que venham. Eu sei que vou morrer". Não era medo que sentia. Nem tão pouco tristeza ou angústia. PAZ. Sentia uma paz tão profunda... uma calma e tranquilidade inundavam o meu pensamento enquanto murmurava : "Não se preocupem, vai ficar tudo bem".

Acordei e sentei-me na cama. Era tudo tão claro na minha cabeça que fiquei assustada. Sabia de cor as palavras que ouvi. Lembrava-me das cores das camisas, sentia os cheiros da rua e o sabor a sangue na boca... e, o mais estranho de tudo, tinha uma dor horrível nas costas, no sítio onde tinha sido apunhalada. Uma dor física. Uma dor que me acompanhou durante dias.

É o poder da mente. O poder dos sonhos.






terça-feira, junho 02, 2015

Não me digas

De ti, quero apenas uma coisa: saber quem és.

Não me interessa o que foste, o que fizeste ou o que aconteceu.
Não quero saber onde moras, que carro conduzes ou que relógio tens. Não quero saber que ginásio frequentas, que restaurante te tem na guest list ou como é a casa dos teus pais.
Não me digas quanto ganhas, como o gastas. Não quero saber.

De ti, quero apenas uma coisa: saber quem és.

Quero saber o que te faz rir, o que te irrita e o que te faz vibrar.
Diz-me qual a tua fruta favorita, para onde queres viajar e porque gostas desse perfume.
Mostra-me como és em família, quem são os teus amigos, o que pensas sobre crianças.
Interessa-me saber para onde vais e quem te acompanha.

O resto, o resto.... eu vou perceber.