quinta-feira, fevereiro 09, 2017

Olhar em frente

Era linda. Frágil e delicada. Azul celeste. O coração amarelo, quase laranja. Linda.
-Viste? Perguntei entusiasmada.
Não, não tinhas visto. Não tinhas olhado para lá. Nem tão pouco quiseste olhar depois de te descrever a flor mais bonita que alguma vez. vi.


Era linda. E tu passaste por ela a 20 centímetros. Olhos postos no chão. E mesmo assim... Não viste.
-Estava atento ao chão, não percebes? A tua resposta - rápida, quase disparada - era em si uma explicação. Pretendias tu.
Porque já ali passaste. Porque uma... e outra... e outra vez ali tropeçaste. Da primeira vez foi só um tropeção. Mas houve outras em que caíste mesmo. Custou levantar, eu sei. Não queres cair novamente. E por isso... Vês cada centímetro do caminho. Bem, do chão, na verdade. Porque o caminho... esse não vês.

Olhas para o chão - sempre à procura do próximo obstáculo na esperança que a tua atenção te impeça de cair... outra vez.
Olhas para o chão. E eu? Não te posso censurar. Os joelhos esfolados doem. Mais ainda doem as mãos que uma e outra e outra vez (já aqui foi dito) usaste para, com esforço, te elevares.
Olhas para o chão porque a cautela trouxe consigo a frustração. Depressa o «Porquê» sem resposta dá origem à maior dor, a da alma.
Olhas para o chão. E os teus olhos cansados parecem já não ver nada mais que o pior.

Acredito que em breve vás olhar em frente. Porque sei que algo te trouxe até aqui. Aprender custa mais do que imaginámos no momento em que nos propusemos à lição. Somos prisioneiros do nosso ego, sem o qual não poderíamos identificar os nossos desafios mas que quase sempre nos tolda o julgamento e nos impede de ver para além do óbvio.
Acredito que em breve vás olhar em frente. Porque ao olhar para o chão será inevitável que um dia percebas que alinhados com os teus pés estão outros... os dos que te acompanham. Sempre.








domingo, fevereiro 05, 2017

Silêncio

Façamos um pacto.
Ficamos em silêncio. Eu não digo uma palavra. Tu também não. E vemos qual dos dois fala mais.

Serão os meus olhos? Correndo o teu rosto, olhando, com movimentos rápidos vendo cada milímetro e procurando o sorriso a que me habituei.
Será o teu coração? Que encostado ao meu, oiço a bater desenfreado enquanto nos abraçamos sem nunca querer largar. Nunca! Nunca mais largar...
Será a minha mão? Que desliza pelo teu braço, para cima e para baixo, para cima e para baixo novamente, dando um carinho mas na verdade memorizando o toque do teu corpo.
Ou serão as tuas lágrimas? Que vejo correr sem parar, apenas para se encontrarem com as minhas enquanto te encostas no meu peito?


Falámos tanto. Tanto. Tanto. Tanto. Dissemos tanto um ao outro.
Eu disse que te amava. Tu repetiste que me amavas também. Com mais convicção ainda eu disse que sinto a tua falta e tu respondeste que todos os dias pensas em mim. Eu perguntei-te «Porquê?». Tu respondeste «Queria eu saber».
Dissemos tanto. E das nossas bocas não saiu... uma palavra.